Semanal de Café

Preocupação com demanda derruba os preços de café na semana
 
Fernando Maximiliano
 
Leonardo Rossetti
Fatores técnicos e a preocupação com a demanda de café promoveram perdas que quase mil pontos para os contratos futuros de café arábica; café robusta se manteve próximo da estabilidade
Resumo

•    Cotações de café arábica recuaram 985 pontos (5,2%) em NY, para US₵ 177,85/lb
•    Preços futuros de café robusta avançaram USD 11/t em Londres (0,5%), para USD 2162/ton
•    No mercado doméstico, os preços de café arábica e robusta recuaram 2,4% e 1,0% respectivamente
•    Dados preliminares de exportação no Brasil indicam uma queda de 40% em fevereiro
•    OIC: exportação mundial de café teve queda de 14% em janeiro
•    Indicadores apontam para um consumo potencialmente enfraquecido ou aquém do potencial
•    ABIC: consumo de café teve queda de 1% no Brasil em 2022
•    Inflação nos preços de café ao consumidor acumularam aumento de 35,4% em 2022
•    Dados COT de café robusta foram atualizados, mas CFTC segue atrasado com dados de NY
•    Relatórios revelaram resultados satisfatórios de indústrias em meio às adversidades econômicas
•    Dólar encerra semana em estabilidade
•    O que está acontecendo com os estoques certificados? O que se sabe e o que se desconhece sobre os estoques de café da ICE

   Fatores baixistas       Fatores altistas

Na última semana, os preços futuros de café arábica recuaram em meio a um movimento corretivo ligado a fatores técnicos e as preocupações dos agentes com relação a demanda de café. Como já foi comentado em outras edições deste relatório, à medida que as questões ligadas a produção de café vão se esclarecendo, as atenções dos agentes se voltarão para as perspectivas para a demanda de café. Um dos pontos principais na semana foi a divulgação dos dados preliminares de exportação no Brasil, que indicaram uma forte queda em fevereiro, evidenciando um possível enfraquecimento da demanda pelo café Brasileiro. 

Por outro lado, os preços futuros de robusta terminaram a semana com leves ganhos em Londres. O mercado de café robusta tem recebido suporte pela perspectiva de forte queda na produção de café na Indonésia, terceiro maior produtor mundial do tipo. O contrato de café arábica mais ativo em Nova Iorque terminou a semana com perdas de 985 pontos (5,2%), enquanto contrato mais ativo de robusta teve alta de USD 11/ton (0,5%). Durante este período, o dólar encerrou em estabilidade em relação à sexta-feira anterior (3).

Intraday semanal (contrato mais ativo) - 27/02 a 03/03

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Fonte: CommodityNetwork Traders’ Pro. Elaboração: StoneX.

Na esteira das movimentações em Nova Iorque, os preços de café arábica e robusta terminaram a semana em queda no Brasil. O indicador CEPEA para o café arábica terminou a semana com perdas de 2,4% cotado em R$ 1.114,38/saca. Para o café robusta, os preços terminaram a semana com perdas de 1,0%, com o indicador CEPEA fechando a sexta-feira (03) cotado em R$ 691,40/saca. 

Como foi antecipado, um dos motivos da queda nos preços de café arábica foi a preocupação com a demanda de café em 2023. Principal notícia da semana foi a divulgação dos dados preliminares de exportação pela Secex, que apontava para um volume de café exportado em fevereiro em torno de 2,04 milhões de sacas, o que representaria uma queda de mais de 40%. Apesar de este ainda não ser o número oficial do Cecafé, os dados levantam dúvidas com relação a demanda mundial pelo café brasileiro, tendo em vista ainda, que as exportações de janeiro tiveram queda de mais de 18%. Estes dados seguem em linha com o que tem foi divulgado pela Organização Internacional do Café (ICO, sigla em inglês), que apontou para uma queda de 14% nas exportações em janeiro, para 9,7 milhões de sacas.

Exportações mensais de café do Brasil (milhões de sacas)

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Fonte: Cecafé, Secex. Elaboração: StoneX. 

A demanda de café é um tema central neste momento, já que vários indicadores têm apontado para um consumo potencialmente enfraquecido ou aquém do potencial. Os dados de importação dos EUA, por exemplo, mostram que houve um avanço de 3,2% nas importações em 2022, mas que este número ainda está 4,3% abaixo do observado em 2019, ou seja, inferior a um momento anterior aos impactos da pandemia da Covid-19. Quando analisamos a situação da demanda estimada no porto, índice que considera o volume de café importado e os estoques no porto, observamos que este indicador teve um avanço de 1% em 2022, mas ainda está 4% abaixo de 2019.

Evolução de consumo de café no Brasil (milhões de sacas)

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Fonte: ABIC. Elaboração: StoneX. 

Ainda com relação ao consumo, na última semana a ABIC divulgou os dados de consumo de café em 2022 no Brasil, que é o segundo maior consumidor mundial do produtor. Os dados da ABIC mostram que houve um recuo de 1,12% no consumo de café torrado e moído, mas um avanço de 1,36% para o café solúvel, resultando em uma queda no consumo total de café de 1,01% em 2022, para 21,3 milhões de sacas. O principal motivo por trás da redução do consumo da bebida foi a forte inflação dos preços; em 2022, enquanto os preços de açúcar tiveram queda de 8%, os preços de leite, arroz e feijão tiveram inflação de 20,7%, 4% e 22,5% respectivamente, com os preços de café registrando uma inflação de 35,4%. Perguntado sobre as perspectivas para 2023 durante o evento de divulgação dos dados, o presidente da ABIC salientou que, apesar do cenário de incertezas, não havia perspectivas para a redução nos preços de café.

Variação dos preços de produtos da cesta básica ao consumidor em 2022 (%)

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Fonte: ABIC. Elaboração: StoneX. 
Atualização relatório CFTC/COT: Conforme nota do próprio CFTC, a divulgação do relatório com a posição dos agentes foi postergada devido a um incidente cibernético. Os dados sobre o mercado de café robusta em Londres foram reestabelecidos, mas as informações referentes ao mercado de café arábica em Nova Iorque ainda seguem atrasadas, com a última atualização disponível apenas para o dia 07/02/2023 Acesse os dados mais recentes no relatório interativo de café CFTC/COT.
Companhias divulgam seus resultados para 2022 

Nas últimas duas semanas, uma série de companhias do ramo cafeeiro têm divulgado os resultados mais recentes de suas operações. De maneira geral, as empresas revelaram resultados satisfatórios em meio às adversidades econômicas apresentadas no último ano. No entanto, destacaram-se os significativos aumentos de preços que foram realizados por todas as companhias, fruto da aceleração dos custos operacionais e dos insumos.

A multinacional Nestlé revelou que suas vendas cresceram 8,4% no consolidado de 2022. A companhia informou que que a maior fonte do seu um crescimento orgânico de 8,3% veio de uma elevação de 8,2% nos preços dos produtos. Com isso, a empresa teve o crescimento real das vendas contribuindo com 0,1% no resultado. Para 2023, a Nestlé espera um crescimento entre 6% e 8%.

A Rede JDE reportou um aumento total das receitas de 16,4%, com 11,3% oriundas a partir de aumentos de preços. Neste quadro, considerando aumento nos custos de produção, o crescimento dos lucros da companhia avançou em 3,3%. Para 2023, as perspectivas da JDE são de crescimento orgânico das vendas entre 3% e 5%.

A Keurig Dr Pepper reportou um crescimento de 10,8% das receitas em 2022, acima das expectativas da empresa, que projetava crescimento inferior a 10%. As receitas voltadas ao café verificaram crescimento de 5,6%, impulsionadas por um aumento de 7,0% em preços, com uma redução de 0,8% no volume vendido.

A rede americana de cafés Dutch Bros destacou em seu resultado referente ao 4º trimestre de 2022 o forte crescimento de receitas. A companhia, que passa por forte expansão e abriu 30 novas plantas nos Estados Unidos, verificou um crescimento de receitas de 44% frente aos mesmos trimestres de 2021.

Na última semana, o grupo americano do ramo alimentício J.M Smucker, dono de marcas disseminadas por todo o globo, entre elas, a Dunkin, registrou para a área do café um crescimento de 11,0% de suas receitas. Todavia, o resultado mostra que o resultado veio de um aumento de 19,0% nos preços praticados, com os volumes tendo recuado 8,0%. Para 2023, juntando todos os segmentos de atuação, o grupo espera um crescimento anual de 6,0%.

Já a chinesa Luckin Coffee anunciou que suas receitas do 4º trimestre do ano passado verificando um aumento de 51,9% em relação ao mesmo período em 2021. O forte aumento vem de uma grande expansão da marca, que abriu 368 novas unidades, totalizando 8.214 lojas em operação, o que também reflete no crescimento gradual que vem senso observado nos hábitos de consumo dos chineses. Devido à forte expansão, os resultados consolidados de 2022 marcaram um aumento de receitas de 66,9%. As receitas de unidades que já estavam em operação aumentaram em 9,2%.
 

O que está acontecendo com os estoques certificados? O que se sabe e o que se desconhece sobre os estoques de café da ICE 

por Alexis Rubinstein
Editora-chefe CoffeeNetwork
[email protected]

CoffeeNetwork (Nova York) – Os estoques certificados têm sido impactantes para os rumos do mercado de café arábica, totalizando 832.072 sacas em sua última contagem, uma queda de quase 17% ano a ano. Embora esses estoques permaneçam mais baixos no momento, um aumento constante tem sido registrado desde as mínimas de mais de 20 anos atingidas em novembro de 2022. Porém, a grande dúvida do mercado tem sido: os estoques que estão repondo os armazéns da ICE são de café novo ou velho?

Uma vez que só é financeiramente vantajoso certificar café na bolsa quando os diferenciais estão baixos, como em 2020, quando despencaram (especialmente no Brasil), é possível inferir que o influxo estoques certificados não representa um café novo.

Com boatos sobre uma mudança nos regulamentos que permitiria a descertificação do café e sua recertificação, essencialmente para eliminar as penalidades de envelhecimento, a CoffeeNetwork conduziu uma entrevista com Tim Barry, da ICE, para esclarecer a situação. Segundo Barry, “as regras nunca impediram que um proprietário submetesse à classificação qualquer produto com base em sua idade ou que tenha sido certificado anteriormente”. Houve, no entanto, uma alteração recente da regra que acelerou a taxa de acúmulo da penalidade de envelhecimento, o que, aliado a um mercado invertido, incentivou esse processo de recertificação.

“A razão pela qual tivemos uma inversão é a queda drástica dos estoques certificados”, disse Ryan Delany, analista-chefe da Coffee Trading Academy, LLC, à CoffeeNetwork. “Com geadas, preços altos, problemas de transporte, custo recorde de frete, etc., houve incentivo para comprar estoques certificados.” Delany explica que o consumo desses estoques disparou, indicando ao mundo todo que mais café é necessário, e provocando a necessidade de reabastecimento dos estoques certificados.

Tim Barry afirma que ainda há riscos envolvidos em colocar o café para recertificação. “Existem custos envolvidos”, afirma. “Qualquer pessoa que envie café para certificação tem que pagar para ter o café amostrado e classificado, e corre o risco de não passar na classificação.”

“A descertificação não é apenas permitida, mas incentivada”, explica Delany. “Por causa do envelhecimento e porque o objetivo dos estoques certificados é manter o preço do mercado futuro real, para que reflita o preço verdadeiro do café, não algum valor financeiro arbitrário.”

A verdadeira polêmica, portanto, está em torno do processo de recertificação, com o incentivo do detentor do produto a economizar. Delany explica que, na maioria dos casos, não é o mesmo lote de café que está sendo descertificado e recertificado para eliminar as penalidades do envelhecimento. “Meu entendimento é que estão buscando naqueles estoques existentes um café com sabor fresco e o submetendo novamente”, uma vez que ainda deve passar pela classificação. Além disso, o café velho está sendo descertificado, misturado com café fresco e recertificado. Com base nos relatórios de estoques certificados da ICE, há cerca de 30-60% de taxa de aprovação do café.

Embora tudo isso seja relativamente preto e branco, há especulações sobre algumas “áreas cinzentas”. Em 2010, a bolsa aprovou o café do Brasil como origem, para entrega em março de 2013. A emenda afirmava que o café deveria estar "livre de todos os sabores não lavados e envelhecidos na xícara", permitindo essencialmente que o café semi-lavado fosse certificado. Uma vez que a emenda se concentra nos sabores, não na composição real do café, é possível que o café esteja sendo misturado com o café natural e aprovado.

Com o mercado em estado de crise em razão dos estoques certificados em mínimas recordes, muitas tradings houses podem ter adotado uma abordagem de “fazer o que for necessário” para reconstruir estoque.

"Este poderia ser o novo mercado de café", diz Delany. “Evoluímos para longe de ser um contrato de café lavado e o mercado evoluiu para longe de ser um mercado de café lavado.” Com o Brasil e a Etiópia, 50% do café do mundo é natural.

Só quando os diferenciais voltarem a recuar veremos uma certificação mais direta do café novo. Com as safras de outubro e a safra 2022-2023 do Brasil encerradas, entramos em um período de aperto antes da colheita da safra nova brasileira. As expectativas para a safra já têm sido divulgadas, variando de 55 milhões a 76 milhões de sacas. Na semana passada, a StoneX estimou a produção em 62,3 milhões de sacas. Se a estimativa mais alta estiver correta, os diferenciais podem desabar e todos esses incentivos para certificar o café brasileiro retornarão. Os estoques pendentes começarão a aumentar e os spreads voltarão a registrar um carrego. Se ocorrer o contrário, os diferenciais continuarão elevados, mas com café novo disponível, poderíamos começar a ver uma normalização.

"Os estoques pendentes secaram", disse Delany, "acho que atingimos o pico do café a ser certificado, mas não vejo os diferenciais caindo no curto prazo, então não haverá novas certificações pendentes. Se houver café para ser descertificado e recertificado, agora seria a hora de fazê-lo.”

tabela de indicadores
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Fontes: ICE/NY; ICE/EU; B3; Commodity Network Trader’s Pro.
 

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